Um ano novo “menos positivo” para o campo

Publicado em: 10 de janeiro de 2012

Após atingir resultados recordes em alguns de seus principais indicadores em 2011, o agronegócio brasileiro prepara-se para um ano “menos positivo”. As rachaduras na economia do mundo desenvolvido e seus reflexos em países emergentes, na demanda global por alimentos e nos preços das commodities tendem a provocar a desaceleração do ritmo de crescimento do setor no país. Mas, de acordo com analistas, produtores, agroindústrias e governo, nada capaz, no cenário atual, de impedir novos avanços em 2012, ainda que em menor velocidade.

E os números que poderão ser superados são expressivos. A colheita de grãos da safra 2010/11, por exemplo, somou 163 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), quase 10% mais que em 2011/12. Isso apesar de a área plantada ter aumentado “apenas” 5%, para 50 milhões de hectares. O valor bruto da produção (VBP) agropecuária, conforme estimativa da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), ultrapassou R$ 318 bilhões no ano passado, 8% acima de 2010.

As exportações do agronegócio, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pelo Ministério da Agricultura, chegaram a US$ 87,6 bilhões de janeiro a novembro, 24,4% mais que em igual intervalo de 2010 – e cerca de US$ 5 bilhões embarcados em dezembro ainda vão entrar na conta. Nesse contexto, o Produto Interno Bruto (PIB) do setor, incluindo todos os elos das cadeias produtivas, é calculado pela CNA em R$ 823 bilhões em 2011, um incremento de mais de 6% na comparação com o ano anterior.

Recordes no ano passado, a safra de grãos, o VBP, as exportações e o PIB do setor podem até não crescer em 2012, mas continuarão polpudos. Apesar de a área plantada com grãos ter aumentado em quase 530 mil hectares nesta safra 2011/12, a Conab estima, por enquanto, que a colheita será cerca de 3 milhões de toneladas menor, em virtude de adversidades provocadas pelo fenômeno climático La Niña em lavouras de algumas áreas de produção, notadamente na região Sul.

Atualmente, as maiores ameaças pairam sobre o milho gaúcho, mas ainda é cedo para afirmar que a previsão da Conab será confirmada ou se quem aposta em aumento da produção está certo. Apesar de a queda dos preços das commodities agrícolas no mercado internacional ter se acentuado em dezembro, a ponto de produtos como algodão, soja e milho terem encerrado o mês passado nos mais baixos patamares de 2011, boa parte da colheita de grãos – que já está começando em Mato Grosso – foi negociada antecipadamente, a cotações melhores.

Conforme o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), vinculado à federação da agricultura e pecuária do Estado (Famato), até setembro, quando as cotações começavam a perder sustentação na bolsa de Chicago, 48% da produção de soja de Mato Grosso, o maior produtor do país, já havia sido comercializada. As antecipações perderam força com a queda dos preços, mas em novembro mais da metade da safra estava negociada e “hedgeada”.

As vendas antecipadas de algodão também foram expressivas no país – quase 40% da futura colheita nacional está vendida, conforme a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) -, mas já com valores menores que os de 2010. Depois de atingirem máximas em 140 anos em Nova York entre o fim de 2010 e o início de 2011, os preços do algodão entraram em queda livre. Daí porque nesta cadeia produtiva talvez estejam concentradas as maiores preocupações em relação às próximas temporadas.

De modo geral, o temor maior envolve as exportações. Beneficiado pelo crescimento dos emergentes, principalmente a China, o campo brasileiro passou como um trator sobre as ervas daninhas oriundas da crise deflagrada pela quebra do banco americano Lehman Brothers, em setembro de 2008, e teve duas temporadas extremamente rentáveis na sequência, ajudado pela pujança de seus embarques.

Com o aprofundamento da crise europeia nos últimos meses e a cambaleante situação americana, contudo, reflexos negativos já são sentidos em emergentes e um crescimento menor da demanda do grupo é dado como certo. Se de fato isso acontecer, os efeitos negativos sobre volumes e preços de venda serão inevitáveis, restando aos exportadores ampliar a comercialização no mercado doméstico. Nesse quadro, as rentabilidades seriam menores, mas há confiança de que o consumo interno seguirá forte.

Em 2011, o mercado doméstico foi fundamental para os resultados de alguns segmentos. Nas carnes, que enfrentaram barreiras na União Europeia e na Rússia, o consumo interno colaborou para manter a pecuária aquecida e ofereceu alternativas aos grandes frigoríficos. Estes, contudo, como ocorreu com agroindústrias de outros ramos, tiveram que conviver com margens apertadas em função da valorização das matérias-primas e esperam que 2012 seja mais remunerador.

Mas os riscos serão maiores. E eles não estão apenas no comércio exterior, cujas sombras há tempos despontam no horizonte. Como já ressalvaram diversos analistas, uma desaceleração maior que a prevista pode quebrar as pernas de produtores e empresas que vêm registrando crescimentos acelerados nos últimos anos, especialmente os que o fizeram por meio de aquisições, de terras ou concorrentes.

Em 2011, mesmo com os recordes observados, o megaprodutor mato-grossense Otaviano Pivetta, por exemplo, teve de unir forças com a Brasil Ecodiesel para dar prosseguimento a sua expansão, já que suas dívidas eram crescentes. A Marfrig, uma das maiores empresas de proteínas animais do país, também viu suas ações na BM&FBovespa caírem em meio ao incremento de custos e à necessidade de capital de giro, ao mesmo tempo em que seu nível de endividamento passou a ser mais questionado por analistas.

É de se esperar problemas em 2012. Produtores de algodão que obtiveram lucro líquido de até R$ 4,5 mil por hectare na safra 2010/11 terão margens menores, assim com as da soja poderão ficar em 2011/12 abaixo de R$ 800 a R$ 1 mil em 2011/12, patamar “normal” no ciclo passado. Mas, capitalizados, têm à disposição ferramentas para proteger financeiramente seus negócios e continuar a avançar. Esperar o pior e tentar buscar crédito com urgência na praça, nesse contexto, não será uma boa saída, tendo em vista a tendência de enxugamento da liquidez no mercado.

“O cenário pode piorar um pouco, mas os produtores estão escaldados. [Ainda assim], os investimentos nas lavouras podem diminuir”, diz a economista Amaryllis Romano, da Tendências Consultoria Integrada.

A concorrência por terras agricultáveis tende a ficar mais acirrada a partir das regras de proteção ao ambiente previstas no novo Código Florestal, em fase final de discussões, e da normatização das compras de terras por estrangeiros no país, que não avançou em 2011 e paralisou transações e investimentos. Além disso, empresas de produção agrícola como a SLC e a própria Brasil Ecodiesel – rebatizada como Vanguarda Agro e palco de uma disputa entre seus principais acionistas (Pivetta e Veremonte, do financista espanhol Enrique Bañuelos) – seguem de olho em oportunidades para crescer.

No momento, a maior parte das projeções indica manutenção ou crescimento de até 2% do PIB do agronegócio em 2012. Especificamente na agropecuária, o Banco Central trabalha com uma expectativa de avanço de 2,5% do PIB. Mesmo o segmento sucroalooleiro, que teve muitos problemas no ano passado por conta de uma forte quebra na safra de cana, prevê dias melhores, ainda que insuficientes para turbinar um novo ciclo de expansão.

É preciso aguardar os rumos da crise nos países desenvolvidos e o próximo Plantio no Hemisfério Norte, em meados deste ano, para prever o que poderá acontecer na próxima temporada de grãos (2012/13). Também as ferramentas do governo para apoiar a produção, como crédito rural com juros baixos, subsídios ao escoamento das colheitas e linhas de crédito do BNDES dependerão de um orçamento federal mais apertado. Mas depois dos resultados de 2011, quando até o pagamento de dívidas agrícolas foi antecipado, o setor julga-se preparado para um ano “menos positivo”.

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