Agricultor brasileiro: o herói vilanizado

Publicado em: 12 de janeiro de 2017

Na iminência de uma divulgação de proporções mundiais, perversamente calcada em um posicionamento ideológico vazio e equivocado que ora começa a ganhar visibilidade, a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão – Abrapa, juntamente com as suas dez Associações Estaduais, vem a público manifestar não apenas sua revolta, mas, principalmente, sua preocupação acerca do tema escolhido como enredo do Carnaval 2017 pela escola de samba Imperatriz Leopoldinense, intitulado “Xingu: o clamor que vem da floresta”.

Com atraso de quase dois séculos, a agremiação carnavalesca resgatou do Nacionalismo Romântico o herói indígena, tão bem forjado por José de Alencar em sua obra O Guarani, e o transpôs, sem qualquer atualização, para os holofotes da Marquês de Sapucaí, com propagação maciça na mídia. Contra esse herói brasileiro – o “bom selvagem” ingênuo e puro – elegeu como vilão o agricultor e todo o agronegócio, acusando-o de roubar as terras dos índios, destruir as matas e secar os rios.

A falácia é extremamente perigosa e encontra terreno fértil na ignorância. Muito provavelmente, quem entoará o enredo e o repetirá no calor da catarse carnavalesca, jamais conheceu o campo e ignora completamente um dos maiores motivos de orgulho que qualquer brasileiro pode – e deveria – ter. Temos o maior carnaval do mundo e o Rio de Janeiro sintetiza essa festa, é fato. Mas também somos uma superpotência planetária em agricultura, que deve colher nesta safra 214,8 milhões de toneladas de grãos: alimentos e fibras para nutrir e vestir uma importante parcela da população mundial de sete bilhões de pessoas. Abastecemos o nosso mercado interno e ainda somos o maior exportador mundial de carne bovina, frango de corte, café, açúcar, suco de laranja, dentre muitos outros.

Do cerrado brasileiro devem sair em torno de 3,53 milhões de toneladas de algodão em caroço, produzidos de maneira sustentável, com adoção intensiva de tecnologia. Para cada hectare plantado, o Brasil produz, em média, 1500 quilos de algodão em pluma, o que representa a maior produtividade de algodão do mundo, em lavouras sem irrigação.

Produtividade alta significa produzir mais em menos espaço, o que se consegue com boas e rigorosas práticas de plantio, manejo de pragas, e variedades adequadas. Devemos em grande parte esse status a uma empresa brasileira, a Embrapa. Essa sim, motivo de orgulho. E, sobretudo, devemos ao constante aprimoramento dos nossos agricultores.

Na contramão da produtividade, por uma série de políticas erradas ou inexistentes, temos 13% do território brasileiro, algo em torno de 110 milhões de hectares, destinados a apenas 0,25% da população nacional: os povos indígenas, enquanto a área utilizada pela agricultura é de 68 milhões de hectares, ou 8% do território nacional. As terras indígenas equivalem, em média, a 482 hectares por pessoa. É como se cada indígena possuísse uma fazenda do tamanho de 482 campos de futebol para cuidar, sem assistência técnica, sem acesso a tecnologia e sem fiscalização. O resultado disso é lastimável. Não basta ter terra, é preciso saber e poder produzir.

Somos um país que pode, diante de qualquer crítica mundial, afirmar que detém 60% de suas matas preservadas. Nenhum outro país tem percentual de cobertura natural preservada desta magnitude, e consegue fazer o que fazemos nas nossas lavouras. Assim, chamar o agro de “belo” faz sentido, mas acusá-lo de ser “monstro” é inaceitável. Quem acha pouco, imagina que os alimentos, madeiras e fibras têxteis simplesmente se materializam do nada. Ignora a presença do homem do campo no seu dia a dia, em cada calça jeans, em cada refeição, habitação, remédio, produto de limpeza, papel… Não existe mágica. Alguém cultivou toda a matéria prima dos produtos à nossa volta. Qualquer outra versão é fantasia de carnaval.

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