Contencioso do Algodão: comunicado para a imprensa

Publicado em: 17 de fevereiro de 2014

A disputa do algodão representa um marco nas relações entre o Brasil e os Estados Unidos. A vitória brasileira no caso algodão fez o país ser reconhecido mundialmente como uma referência de excelência no que diz respeito aos contenciosos em comércio internacional. Foi uma vitória absolutamente emblemática para o país, como repetidamente anunciada pela mídia nacional e internacional à época.

Milhões de dólares e muitos anos foram investidos pelos produtores de algodão brasileiros desde 2002 com advogados, economistas e negociadores para combater os subsídios ilegais norte-americanos. Com o apoio da expertise do Itamaraty e, notadamente, do atual Diretor Geral da OMC, Roberto Azevêdo, os modelos econométricos e as teses apresentadas pelo Brasil na Organização foram aceitas, reconhecidas e exitosas.

Em setembro de 2013 os Estados Unidos começaram a colocar em prática aquilo que o Secretário de Agricultura norte-americano, Tom Vilsak, declarou um mês antes: suspenderam os pagamentos aos produtores brasileiros de algodão.

Os pagamentos de US$ 12,3 milhões mensais fazem parte da disputa vencida pelo Brasil – iniciada em 2002 –, contra os subsídios norte-americanos considerados ilegais pela Organização Mundial do Comércio (OMC). A decisão da OMC foi de que o governo norte-americano pagaria ao Brasil um total de US$ 829 milhões anuais, até tirar de sua legislação os subsídios agrícolas condenados pela OMC.

No dia 20 de fevereiro próximo a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) deve decidir sobre retaliações duras que o Brasil tem a prerrogativa de aplicar contra empresas norte-americanas em resposta à violação dos Estados Unidos à decisão da OMC. Os produtores de algodão brasileiro apoiam totalmente a retaliação.

A promulgação da nova Lei Agrícola americana (Farm Bill) na última semana não exime os Estados Unidos da sua responsabilidade internacional com o Brasil e com a OMC. Pelo contrário. Ainda que o MoU assinado pelos dois países e que previa os pagamentos mensais estivesse vinculado à Farm Bill anterior, existe um débito de mais de US$ 50 milhões e um descumprimento injustificado pelos Estados Unidos.

Some-se a isso o fato de que de acordo com as estimativas de mercado e as primeiras análises feitas pelos consultores da ABRAPA e por técnicos do governo brasileiro, a nova Lei Agrícola e os programas de seguro propostos por ela tendem a causar distorções ainda maiores nos preços e na produção de algodão do que no passado, com a expectativa de causar impactos brutais para os produtores brasileiros.

Nesse sentido, importa destacar que ainda que a nova Lei Agrícola elimine os pagamentos diretos aos produtores norte-americanos, ela cria um novo mecanismo de seguro – STAX – que é complementar ao já existente CIP, que garante, por exemplo, até 90% da receita esperada pelos produtores americanos. Além disso, o programa prevê que o governo norte-americano pague até 80% do prêmio do seguro, garante pagamentos vinculados a preços e produção correntes e não tem limites de pagamento.

Note-se, ademais, que a preços atuais, segundo análises de especialistas no tema, a previsão é um aumento significativo nos pagamentos aos produtores e consequente queda nos preços do algodão. Com efeito, a preços atuais, estimativa de supressão do preço internacional é de 7%, podendo chegar até a 13,4% a depender das condições de mercado. Pelos elementos expostos, pela experiência de negociação em 2010 e por todos os estudos realizados incansavelmente pela ABRAPA é que a Associação insiste na retaliação contra os Estados Unidos.

O governo americano não está pagando o que deve ao Brasil, e não voltará a pagar nem corrigirá a sua legislação agrícola se nada fizermos. Os norte-americanos não estão preocupados em saldar esta dívida, e se o Brasil não agir será uma perda lamentável após mais de uma década de vitórias e reconhecimento internacional.

A lista de retaliação em bens está pronta e a consulta pública para retaliação em direitos de propriedade intelectual já foi finalizada. Em 20 de fevereiro, quando acontece a próxima reunião do Conselho de Ministros da CAMEX, os produtores de algodão esperam que a retaliação contra os Estados Unidos seja seriamente considerada.

De qualquer forma, se assim não o for e se a retaliação não for adiante, a ABRAPA apoiará qualquer decisão do Governo brasileiro para resolver esse caso ainda pendente.

Por fim, vale dizer que o caso não é apenas sobre o algodão. Trata-se de uma vitória histórica para o país e o Brasil não pode perder o valor moral e comercial deste feito no cenário multilateral. Seria uma completa desmoralização para o país e para a OMC.

Gilson Pinesso
Presidente da Abrapa – Associação Brasileira dos Produtores de Algodão

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