Proposta dos EUA divide o governo

Publicado em: 15 de junho de 2010

A “tímida” proposta dos Estados Unidos para redução dos subsídios agrícolas dividiu o governo. O Ministério da Agricultura é favorável ao acordo, enquanto o Itamaraty não descarta a retaliação. Na pasta do Desenvolvimento, a posição é buscar consenso e adiar um pouco mais.

O martelo será batido pelos ministros que compõem a Câmara de Comércio Exterior (Camex) na quinta-feira. A Organização Mundial do Comércio (OMC) autorizou o Brasil a retaliar os EUA em US$ 829 milhões com sobretaxas para a importação de produtos e quebra de direitos de propriedade intelectual. Os americanos não cumpriram a determinação da OMC de retirar os subsídios aos seus produtores de algodão.

A retaliação está marcada para começar no dia 22 de junho, se não houver acordo. Na semana passada, técnicos americanos fizeram uma nova oferta, que foi considerada tímida. Muitas questões estão em jogo, mas um dos pontos centrais é o programa de garantia de crédito à exportação, o GSM.

O Brasil quer que os EUA reduzam os prazos e elevem os juros do programa para desestimular o uso. O GSM é a única parte dos subsídios que os EUA aceitam alterar de imediato. O restante só seria discutido em 2012 na reforma da Farm Bill (Lei Agrícola).

Os americanos receberam “luz verde” do Congresso e aceitaram reduzir o prazo máximo do GSM de 30 meses para 20 meses. Mas ainda está distante dos seis meses pedidos pelo Brasil.

A visão do Ministério da Agricultura, com apoio dos produtores de algodão, é que a proposta é suficiente para fechar o acordo. “O setor mais prejudicado, que é o algodão, está satisfeito. Se houver a retaliação, ninguém vai sair ganhando”, diz uma fonte.

O acordo com os americanos prevê um fundo de US$ 147 milhões anuais de compensação aos produtores de algodão brasileiros até 2012. “A retaliação é muito pior . Significa que os americanos aceitam a punição e não vão mexer nos subsídios”, disse o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Haroldo Cunha.

O Itamaraty está temeroso em relação ao impacto de um acordo “frágil” para a imagem da diplomacia brasileira. A preocupação é “sistêmica”, porque o algodão foi uma vitória dos países em desenvolvimento. O Brasil pode ser duramente criticado pelos países africanos.

Por outro lado, se insistir na retaliação, o Itamaraty vai ser responsabilizado pelos empresários locais, porque estaria “procurando briga” com os Estados Unidos por causa das divergências em relação ao Irã. Segundo uma fonte, esse assunto não está interferindo na negociação.

O negociador-chefe do Brasil, embaixador Roberto Azevedo, negou existir divisão dentro do governo. “Nós estamos negociando com uma posição uniforme”, disse ao Estado.

Adiamento. O Ministério do Desenvolvimento propõe que, se não houver consenso ou tempo hábil para avaliar a oferta americana, a retaliação seja adiada por 30 dias. A avaliação é que o Itamaraty conduz bem o processo, enquanto o Ministério da Agricultura está “afobado”.

Uma fonte não descarta retaliar em bens para pressionar os EUA a ceder e evitar a retaliação em propriedade intelectual. Pessoas próximas aos negociadores americanos dizem que a estratégia é arriscada, porque o clima no Congresso dos EUA se tornará hostil a qualquer acordo.

CRONOLOGIA
Passo a passo da disputa

Março de 2003
Início do processo
Brasil pede que OMC investigue os subsídios americanos aos produtores de algodão

Setembro de 2004
Decisão da OMC
OMC considera subsídios dos Estados Unidos ilegais

Outubro de 2004
Burocracia
Americanos apelam da decisão da OMC e processo se arrasta na burocracia jurídica por alguns anos

Agosto de 2009
Retaliação
OMC autoriza o Brasil a retaliar os EUA em US$ 829 milhões com sobretaxa para a importação de bens e quebra de patentes

Abril de 2010
Adiamento
EUA pedem para adiar a retaliação e oferecem um fundo de US$ 147 milhões aos produtores brasileiros de algodão. Começam as negociações.

Junho de 2010
Fase final
Negociações chegam a fase crítica e Brasil tem de decidir se fecha o acordo ou retalia

Jornalista: Raquel Landim e Renata Veríssimo

Fonte: Abrapa

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